Em 1982, a filha do engenheiro Adenor Araújo, 11 anos, esqueceu
do dinheiro do ônibus de volta do colégio e sequer tinha uma ficha telefônica,
única maneira de usar os orelhões. A mãe, apreensiva pela demora, foi à escola,
onde serenou ao ver a filha.
Adenor, funcionário da Telesc, a companhia telefônica de
Santa Catarina, não dormiu aquela noite: tinha como haver um jeito de fazer uma
ligação sem precisar de uma ficha ou passar pela telefonista, que podia
inverter a tarifação.
> Dois meses de noites claras
Depois de dois meses, Adenor, que começou a desenhar o
circuito na noite daquele dia, estava com um protótipo em cima da mesa.
A inteligência do engenho era simples: dois reprodutores de
fitas cassete, acionados por...
dois polos do circuito que desenhara e construíra.
Quem recebia a ligação ouvia a mensagem que Adenor pediu para
um locutor gravar: "Você está recebendo uma ligação a cobrar. Continue na
linha...". Quem ligava, ouvia: "Você está fazendo uma ligação a cobrar...".
Os dois polos eram sincronizados por bips que disparavam as
mensagens e não derrubavam a ligação quando, ao fim da mensagem, quem deveria
aceitá-la não desligava depois da identificação, invertendo a tarifação para o
polo que recebia a chamada.
E para o circuito reconhecer que era uma ligação a cobrar e
disparar os acionamentos programados? Simples, de novo. Bastava começar a
ligação com o número 9.
> Simples uma pílula!
Eu falei simples duas vezes? Sou um boçal. Simples uma
pílula! Simples é respirar, que já está gravado no DNA: o Adenor é um gênio,
pois ninguém antes dele pensou na inversão automática da tarifa e muito menos
queimou pestanas, e os dedos com solda, por dois meses, para pintar o seu sete.
> E aí…
E aí ele fez uma carta para a Telesc, pedindo que lhe fosse
testada a arte. No primeiro teste o diretor ligou, a cobrar, para o então
ministro das Telecomunicações, Haroldo de Mattos, que estava no Rio de Janeiro:
foi a primeira ligação a cobrar do Brasil.
No mesmo ano, 1982, o invento começou a ser implantado no
Brasil, o que fez todo o sistema economizar uma fortuna com telefonistas 24
horas. É claro que hoje em dia, quando se ouve aquela musiquinha da chamada a
cobrar, alguém deve amaldiçoar o Adenor, mas quem origina a chamada deveria
orar por ele sempre.
> A patente e a batalha jurídica
Em 1984, Adenor recebeu a patente e começou uma batalha
jurídica com a Telebrás, que entrou na Justiça para anular a patente, alegando
que já existia a ligação a cobrar e Adenor “apenas” automatizou o processo.
Aposentado, aos 72 anos, Adenor jamais desistiu da labuta
jurídica e, neste 1º de outubro, 31 anos depois, ele recebeu uma ligação, que
não era a cobrar: o seu advogado, que acompanhava o julgamento da causa no
Superior Tribunal de Justiça, comunicou-lhe que a Corte o reconheceu como o
único inventor do sistema automático da chamada a cobrar no Brasil, e proprietário
legítimo da patente.
Mas esta é a parte do reconhecimento intelectual, o que é uma
glória, pois ter ideias roubadas, ou não reconhecidas, é um sofrimento moral
sem medidas. Adenor agora começa a batalha pecuniária, pois como a Telebrás foi
extinta, ele deverá acionar as suas sucessoras para receber os royalties
devidos, pretéritos e futuros, pelo uso da sua genial invenção. Fonte, Blog do Parsifal.
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